A união das divergências
Realizou-se neste fim-de-semana o Congresso Nacional do Partido Socialista, em Santa Maria da Feira. O mote em destaque foi “Novo Rumo”.
Foto: publico.pt |
É de facto necessário um novo rumo para Portugal e para a União Europeia. Somos constantemente confrontados com economistas a tentar fazer política (e políticos a desistirem de o fazer) que nos presenteiam com a delirante ladainha de que não há alternativas. Em democracia, mesmo que o nosso Presidente da República diga que não, há sempre alternativas.
Contudo, e porque o país assim o entende, o PS ainda não se afigurou como a alternativa pretendida. Isto é, há um clima de clara desconfiança em torno do líder do partido por, supostamente, ser uma réplica da impreparação de Passos Coelho. Discordo. Não obstante, esse clima de desconfiança é, a meu ver, muito devido a outro fator.
Esse outro fator é a sombra de outra desconfiança. Uma desconfiança que tem populado dentro do PS. Achei que o partido está muito unido mas que essa união parece demasiado consensual e resignada quando se sabe que ainda há umas semanas tínhamos um Seguro inseguro, olhando sempre por cima do ombro e a perguntar qual era a pressa a quem exigia outra liderança. Parece que houve um surto de amnésia e que de repente este é o candidato que toda a gente sempre quis. Muito mal esse fingimento.
Apesar de todos saberem que o secretário geral do partido tinha o caminho completamente livre, num passeio socialista por Santa Maria da Feira, comportaram-se praticamente todos como se não existisse oposição oficiosa a uma liderança que ainda tarda em afirmar-se junto dos portugueses, como mostram os estudos de opinião.
Faltou vivacidade nos discursos (como se percebeu pelas palmas); a bajulação e o elogio fácil imperaram numa altura em que o sistema político precisa de ideias e de mais e melhor política. Cerraram fileiras à volta do líder quando é necessário abrir o partido e colmatar as deficiências que eventualmente haverá.
Acho bem que se elogie o que se tem sido feito bem, nomeadamente as propostas apresentadas. Não podemos, contudo, uniformizar à força do elogio num Congresso de três dias, quando se trata de um partido tão plural e tão catch all como é o Partido Socialista.
O elogio pode ser construtivo, é verdade, mas também é verdade que criticar e pôr defeitos o é. Se essa prática fosse mais generalizada, a única suposta “voz dissonante”, que se afigurou em Sérgio Sousa Pinto, não teria causado o alarido e o desvario noticioso que causou.
Denunciar problemas e procurar soluções não é ir contra o partido, muito menos enfraquecê-lo. É, isso sim, ter ambição num partido mais forte, mais presente e mais credível, características pelas quais a nossa Democracia está faminta.
Não gostei deste Congresso, mas gostei da perspetivação que foi feita por alguns relativamente a coligações com a restante esquerda, pois mostrou grande sentido de fair play e sentido de Estado, coisa rara nos tempos que correm. Resta saber se na altura devida a restante oposição saberá agarrar essa oportunidade de verdadeira união e consenso.
O PS será Governo em pouco tempo. Quero que esteja realmente preparado para o que aí vem e consciente da necessidade de pôr os interesses nacionais em primeiro lugar para, e parafraseando a “voz dissonante”, não mudarmos de protagonistas e o cenário político-económico permanecer inerte e inalterado, dentro de uma União Europeia cada vez mais débil.
“O sim é rotineiro, está sempre ali. Há que introduzir um não para enfrentar o sim, que é o consenso hipócrita em que mais ou menos estamos a viver”. Um Novo Rumo para sair desta estagnação atual terá de passar por dizer “não” mais vezes, a nível nacional e internacional, como assim exige o povo.
(Nota do autor: a última citação pertence ao único português Nobel da Literatura, aquele que todos reconhecemos à exceção do representante máximo da nossa Nação.)
João Martins
1º ano, Ciência Política
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